O mês de Dezembro regressou! A sua chegada fria e invernosa, traz-me doces recordações. A imensidão de sensações, de cheiros e sabores que invadem o meu pensamento com a sua entrada no calendário é intensa e reconfortante. A memória que tenho dos preparativos em família para a noite de Natal é mágica. E essa magia ainda funciona...
Olho para um canto e consigo voltar a ver a minha avó paterna, envolta em doces odores que emanavam do fogão onde panelas, tachos e formas pareciam ganhar vida e, em conjunto com as suas magníficas mãos de cozinheira, criavam uma afinada orquestra de aromas e paladares. Consigo vislumbrar o divinal leite creme bem queimadinho, o pudim de ovos recoberto de verdadeiro caramelo fumegante e o pequeno tesouro que ficava bem guardado num tacho de ferro, onde se escondia um desfiado bacalhau, que entrava em cena logo após o prato principal. Olhando um pouquinho mais para o lado, encanto-me ao relembrar a minha mãe, sempre alegre e bem disposta, corada de alegria, a fazer magia com o açúcar, o leite, a canela, os ovos, o pão e vinho do Porto. De repente, a cozinha enchia-se de cheiros doces e apetitosos, que acompanhados dos cânticos de Natal entoados pela voz materna, criavam uma atmosfera única, plena de conforto, e encantamento, que nunca vou esquecer. Lá estavam os doces sonhos, que se espalhavam pela terrina com todas as formas e feitios tal como os verdadeiros sonhos de vida, as deliciosas rabanadas de leite que dispostas em travessas eram carinhosamente regadas com um molho de vinho do Porto, as rabanadas douradas que de tanto açúcar terem, cobriam o ar de candura, a famosa aletria recoberta com pequenos flocos de canela, que em conjunto criavam um verdadeiro arco-íris de doçura. Desviando os meus olhos para outro canto da divisão, observo o meu pai em amena cavaqueira com o pescado da Noruega. O bacalhau, rei e senhor das cozinhas neste mês natalício, vestia-se de gala e aparecia ricamente ornamentado na travessa rodeado de todos os seus súbditos: os ovos, as couves, as batatas, as cenouras e o fiel azeite pintalgado de alho. Aquilo que muitos chamam bacalhau com todos, parecia-me aos meus olhos de criança, um prato muito especial que só o meu pai sabia fazer, o que o transformava num super herói também da cozinha.
A azafama familiar era grande. Crianças e adultos todos contribuíam à sua maneira, para que o Natal fosse sempre tão especial. A árvore de Natal rodeada de embrulhos coloridos e vistosos fazia parte da festa, mas o verdadeiro presente foram estas memórias e estas recordações. Este presente que me foi dado ao longo dos anos em que fui criança, adolescente e mesmo durante parte da minha vida de adulta, não tem preço. Dos outros presentes poucas recordações possuo, mas estas doces e carinhosas lembranças, estarão sempre na minha memória e na dos meus irmãos. Mas como a tradição ainda é o que era, tentamos manter viva esta recordação nas gerações mais recentes. Agora olho em volta e já não vejo a minha avó paterna, nem a minha mãe, mas a magia continua bem presente em toda a tradição que tentamos manter viva. Os sonhos, o pudim, a aletria, as rabanadas, o bacalhau e até o pequeno tesouro do tacho de ferro estão sempre presentes. Até os cânticos de Natal permanecem vivos, apenas cantados por vozes diferentes. A magia ainda existe...e na noite de Natal se olharmos bem, fizermos silêncio e escutarmos com muita atenção ainda conseguimos sentir e ouvir aqueles que iniciaram esta magnífica tradição e nos deram o melhor presente que poderíamos ter recebido!
Entendo TÃO beemmm !!! Partilhei da mesma magia, e agora que somos cada vez menos à mesa, tentamos manter acesa a chama do Lar e contamos histórias de Natais passados, entre risos e lágrimas, mas sempre com muito amor.
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